Resumo de Reunião Clínica
 
Uma mulher de quase sessenta anos reinternou-se para nova cirurgia de retirada de um carcinoma papilífero de tireóide, a terceira em pouco mais de dez anos e já fora de possibilidades terapêuticas. Apesar de devidamente informada sobre sua doença e encaminhada para tratamento quimioterápico após a primeira cirurgia, a paciente não seguiu as orientações médicas. Voltou ao hospital há um ano quando já apresentava dificuldades na deglutição e, na época, ainda foi possível colocar e manter uma sonda nasogástrica por certo tempo após a cirurgia. Também dessa vez não seguiu nenhum tipo de tratamento ambulatorial e emagreceu acentuadamente com a evolução da dificuldade de deglutição em virtude da invasão do esôfago pelo tecido neoplásico, a tal ponto que a equipe cirúrgica nada pôde fazer ao operá-la agora.
Na enfermaria, seu comportamento destoava das preocupações da equipe. Enquanto os médicos estavam preocupados e abatidos com a grave condição da paciente, esta estava tranqüila e falava que a cirurgia desta vez a curaria porque Deus assim o queria. Por outro lado, em tom de despedida, só falava de sua difícil vida e de seus entes queridos já falecidos. Lembrava muito da mãe e da avó e lamentava não ter a sorte delas em ter um fim de vida rápido e indolor. Acreditava que o sofrimento antes da morte tinha o sentido de purificação e sonhou com a mãe antes de se internar desta vez. No sonho a mãe foi visitá-la em casa e ela se surpreendeu com a visita, pois sabia que a mãe estava morta.

A paciente novamente não deu continuidade ao tratamento após a alta e, a partir deste caso, a equipe cirúrgica decidiu iniciar um acompanhamento mais próximo dos pacientes portadores de câncer.

 

A discussão se iniciou pelos aspectos autodestrutivos da paciente: foi assinalado o freqüente uso de metáforas sobre a morte no relato dela (o chamado de Deus, a visita da mãe, as idéias sobre purificação, o lamento por não ter uma morte rápida e indolor) e o sonho com pessoas de nossas relações já falecidas, que é sempre a expressão do desejo de reunião com estas pessoas através da própria morte.

Em seguida, discutiu-se a característica atitude passiva que os profissionais de saúde têm relação aos pacientes: médicos e psicólogos estão sempre à disposição dos pacientes desde que sejam por eles procurados. Tal comportamento mostra-se inadequado com os pacientes que apresentam uma psicodinâmica autodestrutiva como era o caso desta paciente.

Finalmente, foi discutida freqüente interrupção dos atendimentos psicológicos realizados nas enfermarias em virtude dos diversos procedimentos que devem ser realizados com os pacientes. Foi assinalado que a melhor estratégia nessas situações é incluir no atendimento o profissional que o está interrompendo, nunca se excluir encerrando o atendimento e nem excluir o outro profissional solicitando que ele aguarde o final do atendimento, porque as condutas de exclusão apenas favorecem a luta de poder dentro da equipe. 

retorna