Resumo de Reunião Clínica
 

Uma mulher de mais de 40 anos, casada e atualmente sem filhos, reinternou-se para nova cirurgia de hérnia de disco. Sua única queixa era uma forte e interminável lombociatalgia. Internou-se a primeira vez há 8 meses com a mesma queixa, foi operada e teve breve melhora da dor, que aos poucos foi voltando até chegar ao ponto em que estava antes da cirurgia. Embora demonstrasse vontade em se operar e expressasse esperança com a nova cirurgia, mostrava-se contrariada com inúmeras ocorrências da enfermaria. Se bem que algumas destas reclamações tivessem fundamento objetivo, causava a impressão de que sua contrariedade era maior do que seria esperado, às vezes chegando a ocupar grande parte de suas sessões com o membro da equipe de Psicologia Médica associada à enfermaria. Incidentes atrapalhando o atendimento foram freqüentes e observou-se uma certa dificuldade no manejo dos mesmos. A paciente relatou que suas dores lombares se iniciaram após o falecimento de sua única filha, que aos 6 anos apresentou uma grave neuropatia que a levou a um estado vegetativo por mais de 20 anos. Informou ainda que seu marido também passou a apresentar dores lombares, estando no momento licenciado de seu trabalho. Obteve remissão sintomática após a segunda cirurgia, mas 2 dias antes de voltar para casa as dores reiniciaram.

Debateu-se, inicialmente, a importância a as dificuldades no estabelecimento do lugar profissional, fundamental para o estabelecimento do vínculo terapêutico. Em seguida, foi comentado o uso, pela paciente, do mecanismo de identificação projetiva para expressar seus sentimentos e a ambivalência dela na relação com a filha doente e com a cirurgia. Depois, foi assinalado que este é mais um caso de luto patológico, no qual a relação existente entre a morte da filha e a dor lombar significa que a dor era a única lembrança que a paciente conseguia ter de sua filha, uma lembrança que certamente expressa a ambivalência presente na relação. Deixar de sentir a dor equivaleria a esquecer a filha, daí a impossibilidade de remissão do sintoma. A reunião foi encerrada lembrando-se o cuidado clínico que se deve ter com sintomas físicos e mentais que estão servindo como a única forma de manutenção de um vínculo com pessoa importante e necessária para a preservação da vida do paciente.

retorna